MOMENTOS

FOLHA DE OUTONO

 

Quase nada tenho já para viver

Quase tudo ficou ainda por fazer

Correram os anos e, num repente,

Foi-se a coragem de olhar a vida de frente

 

Tão curto foi o tempo de criança

Tão poucos os momentos de esperança

Crescem os filhos entre auroras de encanto

Foge-nos a luz dos olhos afogada em pranto

 

Sou agora, frágil e ressequida folha de outono

Que um vento de fim de tarde arrancou do trono

Recordação terna dos dias que lhe mudaram a cor

Promessa de primavera num afago de fugidio amor

 

A folha amarelecida, outrora verdejante,

É hoje avó feliz, carinhosa e tolerante

Pedindo à vida algum tempo, algum espaço

Para saborear o que resta na ternura dum abraço.

 

Lourdes dos Anjos

In: ”Entre o Granito e a Neblina”,

Dito pela própria na Tertúlia da

Galeria Vieira Portuense.